Eu, meu vô e o Alzheimer

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“Oi vô! Beleza?”

Essa é a saudação típica que costumo fazer com meu vô, que já está com seus 80 anos, sempre que o visito. Recebo um cumprimento e um olhar meio esquisito de volta, para logo após ouvi-lo perguntar para a minha vó ou para a minha mãe, em alemão, “quem é essa menina”?

Apresento-lhes o Alzheimer. Acho que nunca se falou tanto na doença como nos últimos anos. Livros, filmes e séries que abordam o tema têm se tornado cada vez mais comuns, e tentam explicar um pouco como essa doença neurodegenerativa funciona. “Perda da mente” é uma das formas mais ilustrativas e verdadeiras de se definir as doenças que envolvem a degeneração nervosa, na qual não só o Alzheimer está incluído, mas também a doença de Parkinson, a de Huntington e a esclerose lateral amiotrófica.

As doenças neurodegenerativas são chamadas assim pois ocorre destruição progressiva e irreversível dos neurônios nos indivíduos acometidos, levando o paciente a perder funções motoras, fisiológicas e cognitivas de forma gradual. As mudanças que ocorrem no corpo, ao longo da vida, e que envolvem alterações nas funções de diversos órgãos, como fígado, rins e pulmões, tornam os idosos o grupo onde a incidência de doenças é muito maior. Neste quesito, as doenças neurodegenerativas podem ser enquadradas. A diminuição das funções orgânicas, da capacidade funcional e do aumento da sensibilidade do Sistema Nervoso Central (SNC) são típicas destas doenças, onde a morfologia celular, a histologia nervosa e a neurotransmissão estão anormais. Ocorre diminuição do volume do encéfalo, decorrente da perda de neurônios, que é causada pela agregação e deposição de proteínas mal dobradas no tecido cerebral, formando oligômeros insolúveis que se acumulam de forma gradual por toda a vida.

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Reprodução: Giphy

Especificamente na doença de Alzheimer, ocorre deposição de uma proteína chamada de beta-amiloide. Lá em 1906, Alois Alzheimer, psiquiatra alemão que deu início aos estudos da doença, já correlacionou a demência apresentada pelos pacientes com o acúmulo cerebral desta substância. O acúmulo de beta-amiloide é muito característico, mas ocorre também deposição de uma proteína chamada Tau. Além disso, hoje se sabe que ocorre perda de neurônios do tipo colinérgicos, que liberam o neurotransmissor acetilcolina. Desta forma, pacientes com Alzheimer possuem um déficit na quantidade deste neurotransmissor. Por fim, os níveis elevados do neurotransmissor glutamato também são observados nos pacientes, levando à excitotoxicidade característica da doença, visto que esta substância excita o nosso sistema nervoso.

O conhecimento da fisiopatologia da doença permitiu o desenvolvimento de estratégias terapêuticas que infelizmente não curam a condição, mas retardam sua progressão e minimizam os sintomas. Os fármacos, portanto, atuam inibindo enzimas que degradam a acetilcolina, por exemplo, ou inibindo o funcionamento de receptores do glutamato. Existem ainda outros medicamentos com eficácia não comprovada e que são extremamente difundidos na comunidade, como é o caso do Ginkgo Biloba. Esta planta de origem chinesa tem como fama a melhora da memória, mas não existe evidência consistente ou convincente que a torne um fármaco em potencial. Não foi surpresa quando descobri que meu vô fazia uso deste fitoterápico. Estatinas, curcumina e anti-inflamatórios também estão incluídos no rol dos sem eficácia científica comprovada.

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Reprodução: Giphy

Por mais que meu vô me responda que sim, “está tudo beleza”, todos nós da família sabemos que não está. Me parece que a doença afeta muito mais os indivíduos que convivem com o paciente do que com ele em si. Como dito lá em cima, a perda da mente faz com que a pessoa não se dê conta de tudo que está acontecendo. Neste aspecto, o paciente não percebe a condição de demência que aos poucos vai se instalando, contra a qual ele não consegue lutar. Por enquanto, nos resta alegrar seus dias e relembrá-lo, a cada vez, que ele tem uma neta que se preocupa e que por vezes martinica na difusão do conhecimento (ou pelo menos tenta).

Imagem destacada: Healthline.com

 


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